Entre 2010 e 2012, uma onda de protestos populares tomou países do norte da África e do Médio Oriente, trazendo à tona uma série de antigas reivindicações e derrubando velhos ditadores. A “Primavera Árabe“, como ficou conhecida, fez-se notar na Líbia já no início de 2011, com manifestações nas ruas, conflitos armados e dezenas de milhares de mortes.
Naquele país, milícias rebeldes travaram violentos combates com forças do governo, em uma guerra civil que culminou com o assassinato do ex-ditador Muammar Gaddafi. Nos embates, um grupo armado de oposição chamou a atenção por sua peculiaridade: a brigada era formada por combatentes surdos. Com o nome de “Brigada dos Surdos Mudos” de Misrata (cidade ao norte do país), a tropa reuniu quase 90 soldados, dos quais apenas 7 ouvintes – fluentes em língua gestual.
Sediados no prédio que outrora abrigava uma base da polícia secreta do antigo regime, a
brigada de surdos atuava principalmente em postos de controle e vigilância, algumas vezes participando de “frentes de combate” ao lado de rebeldes ouvintes.
Ao falar sobre a acuidade visual dos soldados surdos, Khalid Mustafa Sati (um dos líderes do grupo) relembra que, certa vez, ao entrar em uma loja, reparou um discreto movimento atrás de uma janela de canto e ”empurrando os outros para trás, mirou com o seu rifle AK-47, matando um soldado de Gaddafi segundos antes de ele lançar uma granada no salão, salvando todos os que estavam ali” (retirado de Globalpost, 20/09/2011).
“Não é difícil lutar, mas há uma série de perigos”, diz o combatente surdo Abubakar Mustafa Awene, de dezoito anos. “Mísseis caem ao nosso redor constantemente, mas se eu morrer eu vou para o céu por estar fazendo o que é certo”, conclui o rapaz, convicto de sua missão.
Além dos vários motivos que deflagraram a guerra civil, surdos do país acusavam Gaddafi de manter um governo autoritário e segregacionista, com poucos direitos dados ao povo surdo (as associações de surdos eram proibidas pelo Estado, para se evitar alianças políticas e conchavos entre cidadãos líbios). Alguns surdos afirmam que agentes da polícia secreta do governo os assediavam, pedindo para atuarem como espiões nas comunidades surdas, com a intenção de evitarem que conversas oposicionistas (silenciosas, feitas em língua que “burlassem” o controle do Estado) acontecessem longe dos ouvidos e das vistas do governo.
A guerra, com toda a sua barbárie, também é levada à cabo em sinais.
Uma interessante reportagem veiculada pelo programa Signes (do canal suíço RTS) e pelo magazine L’oeil et la main (do canal France 5) mostra a empreitada dos rebeldes surdos na Líbia: La Brigade Silencieuse (com legendas em Francês).
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Categoria: Curtas / Animações (Reportagem)
País: Líbia / França
Línguas: Francês e Langue des Signes Française (LSF)